A disposição dos chorões em preservar um dos gêneros mais ricos da MPB
POR BERNARDO PEREGRINO E JONAS MOURA
“Tudo o que a gente pode fazer de forma improvisada a gente faz”. A frase é de Maurício Carrilho, violonista, arranjador e um dos fundadores da Escola Portátil de Música. Todos os sábados de manhã, os portões do campus da Unirio, na Urca, se abrem para que mais de mil matriculados nos diversos cursos oferecidos sejam submetidos ao misto de improviso e organização que sustenta o método de ensino da EPM. A base de tudo é a experiência dos professores, músicos profissionais comprometidos em preservar – e renovar – um dos gêneros musicais mais tradicionais da cultura brasileira: o choro.
A iniciativa surgiu em 2000 de forma despretensiosa, como contou Maurício, enquanto fumava seu cigarro de palha. “Nos anos 90, eu e um grupo de músicos dávamos aulas em festivais de música popular. Uma das alunas era filha da diretora da Sala Funarte e propôs que fizéssemos uma oficina de choro lá. Era algo simples.” Em pouco tempo, no entanto, o número de alunos duplicou, surgiram interessados em investir na ideia e a escola logo se consolidou como centro de difusão da MPB.
Promovida pelo Instituto Casa do Choro, ela conta atualmente com 28 professores, que ministram teoria e prática no campus da Urca. Maurício lembrou que o nome da escola veio do produtor e compositor Hermínio Bello de Carvalho. “Não tínhamos um local fixo, então ele chamava de ‘portátil’. E como era um projeto que permitia que fizéssemos incursões, festivais e minioficinas, acabou pegando”, contou. “É um nome simpático.”
Toda essa usina portátil de conhecimento musical é patrocinada pela Petrobras, parceira do projeto há sete anos. Mas Maurício esclarece que 60% das despesas são cobertas apenas com a contribuição dos alunos. Ocasionalmente, vendem camisas para incrementar a arrecadação, como no sábado em que a reportagem do Ecos visitou o ensaio.
A flautista Maria Souto entrou na EPM como aluna em 2004. Ela se formou em ciências sociais, mas o contato com a música foi decisivo: em 2009, retornou à escola, mas como professora. Ela considera que o diferencial está no corpo docente. “São todos músicos do gênero, que estão no mercado, gravando discos e tocando com outros profissionais. Isso tem a ver com a forma original de disseminação dessa música, pelas rodas de choro. E eles conseguiram sintetizar isso num projeto educacional.”
No fim das aulas, todos os alunos se reúnem no jardim do campus e a tradição das rodas é invocada com ainda mais força. A combinação de cada naipe de instrumentos resulta no bandão, cujo repertório é ensaiado durante as aulas. “Temos o cuidado de, para cada música mais difícil, colocar outra mais fácil”, pontuou Mauricio. Segundo ele, essa estratégia serve para que os alunos de todos os níveis possam participar do ensaio.
Assistir ao bandão dá dimensão da quantidade de cursos oferecidos pela escola. Além dos muitos instrumentos, os alunos podem fazer cursos de composição, harmonia e canto, entre outros. Foi, aliás, o que chamou a atenção de Leandro Resende, aluno do terceiro período da Eco que se matriculou nas aulas de violão em março. “Lá eu entro em contato com grandes músicos e tenho a possibilidade de estudar coisas diferentes, como teoria musical.” Na teoria ou na prática, no improviso ou na organização, uma coisa é certa: o choro está bem acolhido, pelo menos do lado de dentro dos portões da Unirio.